A mudança cultural em torno dos Dados Pessoais

Textos 08 maio de 2020
Inara Pinheiro Lages Advogada

A internet trouxe inúmeros benefícios para a sociedade em virtude dos insumos contributivos à cultura, ao acesso e à democratização da informação, da valorização da diversidade e do processo de inclusão digital. Apesar disto, é indispensável ponderar que junto dos benefícios, apareceram situações jurídicas advindas da sociedade informacional que necessitam de regulamentação e reflexão.

De um lado tem-se o acelerado desenvolvimento tecnológico e a consolidação dos espaços públicos virtuais, que contempla um extenso diâmetro de interação e troca de informações. De outro, tem-se a necessidade de proteção desses dados, o que se contrapõe ao crescimento do interesse comercial no compartilhamento de informações, sob a justificativa do fomento à inovação e à livre iniciativa.

É possível perceber a mudança no comportamento social e, consequentemente, um novo modelo de negócio. O ciberespaço é a nova praça de rua; o novo local para fazer amigos; o novo ambiente de “convívio social”; a nova biblioteca; a nova estante de livros. As informações fornecidas na internet passam a influenciar pessoas e empresas, representando, inclusive, vantagens competitivas no mercado. Porém, não se restringem somente aos negócios. É preciso considerar, ainda, que o ciberespaço leva os usuários a serem induzidos, ou seduzidos, pelo “exibicionismo exacerbado” e pela liberdade de expressão, esquecendo a relevância da privacidade e das informações pessoais disponibilizadas.

A coleta e uso de dados não mais se restringe a quem disponibilizou e não paralisa, por exemplo, na página de rede social para onde as informações foram direcionadas. Na verdade, os dados pessoais circulam com facilidade e perpassam os interesses das empresas, de modo que em poucos cliques é possível descobrir quem é determinada pessoa, onde ela estava, seus interesses de negócios, seus interesses de consumo, seu perfil comportamental etc.

Nesse contexto, informações pessoais são fornecidas espontaneamente no ciberespaço, gerando um vultuoso rastro digital, e sem ponderação de relevância, seja para cadastros em empresas, cadastros em sites, compras em lojas, confecção de currículo virtual e outras inúmeras finalidades.

LGPD (LEI 13.709/2018) e a mudança de mindset

Com fito em promover a regulamentação, o movimento global de proteção de dados pessoais ganhou força também no Brasil e em 14 de agosto de 2018 foi sancionada a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018). A finalidade precípua da lei é “proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural” e, para tanto, se atine exclusivamente a operações de tratamento de dados.

No entanto, além da necessidade de regulamentação, o ambiente virtual requer a mudança de mindset – mudança cultural, o que vai além das medidas de governança da lei. É preciso ponderar, com urgência, a relevância da disponibilização de determinada informação. No caso das empresas, é imprescindível ir além: é preciso ponderar a relevância da coleta dos dados pessoais e, sendo relevante, é preciso armazená-los e tratá-los de forma segura, com consentimento, e sem violar os interesses do titular.

O cenário atual – de pandemia por conta do novo coronavírus- traz expectativa quanto ao vigor da Lei Geral de Proteção de Dados, diante da das discussões do PL 1179/2020 e da Medida Provisória 954/2020, o que deu um novo fôlego para estados, organizações. empresas e qualquer outro responsável por coletar e tratar dados pessoais. Embora o adiamento esteja em vigor, a MP ainda precisa passar pelo Congresso Nacional, que pode ou não aprová-la e convertê-la em lei.

Este cenário exige uma a mudança de mentalidade das pessoas físicas e jurídicas: aos titulares, o objetivo é evitar a má utilização ou a utilização desnecessária dos seus dados pessoais e, para as empresas e outros responsáveis jurídicos, o objetivo é evitar multas e outras sanções pela não aplicação do LGPD.

A meta é clara: todos precisam se adequar e a proteção dos dados pessoais e o monitoramento destes são um ato contínuo e de persistência. As empresas que quiserem destaque nacional e/ou internacional devem, obrigatoriamente, promover esta mudança cultural.